Anatomia, fisiologia e biomecânica do Ombro
O ombro é formado por vários músculos, 3 articulações verdadeiras e 2 funcionais que fazem com que esta articulação apresente maior mobilidade em relação a outras do corpo humano. Segundo Kapandji (3), o complexo articular do ombro possui 5 articulações: escapulotorácica, acromioclavicular, esternoclavicular, subdeltoidea e escapuloumeral, sendo a última mais importante no ponto de vista biomecânico e também denominada glenoumeral. Cada articulação tem sua amplitude e graus de movimento limitados pelas estruturas ósseas, ligamentares, tendinosas, capsulares ou musculares, sendo que uma sincronia perfeita entre todo o complexo articular do ombro faz com que grandes movimentos com os membros superiores possam ser realizados (4). Essa perfeita sincronia que ocorre entre o úmero e a escápula denomina-se ritmo escapuloumeral (5) e a junção escápula, clavícula e úmero é chamada de cintura escapular.
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Várias são as estruturas anatômicas que compõem o complexo do ombro, entretanto, quando relacionadas à patologia em questão, algumas delas merecem destaque especial: as articulações acromioclavicular e escapuloumeral, as bursas subdeltoidea e subacromial, o arco acromioclavicular, os ligamentos coracoumeral e glenoumerais, os tendões dos músculos do manguito rotador e do bíceps braquial e o músculo deltoide.
A articulação acromioclavicular é do tipo sinovial plana e está localizada na porção externa da clavícula (3), mais especificamente do processo acromial da escápula até a extremidade distal da clavícula (5). Possui cápsula fibrosa periarticular, um disco intra-articular e os ligamentos acromioclaviculares e coracoclavicular, que mantêm sua estabilidade(6). Já a escapuloumeral é considerada verdadeiramente anatômica, do tipo sinovial, multiaxial e esferoide (3, 6), tendo como superfícies articulares a cabeça do úmero, a cavidade glenoide da escápula e o lábio da glenoide (3). Do ponto de vista biomecânico é a principal articulação do complexo articular do ombro.
Na articulação glenoumeral, a relação entre a rasa, côncava e pequena cavidade glenoide e a grande e arredondada cabeça umeral faz com que haja pouca coaptação articular, que é eficazmente compensada pela presença de um lábio formado pela cápsula articular e o tendão da cabeça longa do músculo bíceps braquial. Além disso, a posição anatômica dos ligamentos coracoumeral e glenoumerais superior, médio e inferior e a ação de tensão contrária dos tendões dos músculos do chamado manguito rotador do ombro, auxiliam na estabilização desta articulação (5, 7).
O manguito rotador é composto pelos tendões dos músculos subescapular, supraespinhal, infraespinhal e redondo menor, de forma que a fusão destes desenha um capuz que cobre a cabeça do úmero superiormente (2). A função principal do manguito rotador, além de participarem efetivamente na rotação interna (subescapular), abdução e rotação externa (supraespinhal) e abdução na horizontal e rotação externa (infraespinhal e redondo menor), é a de manter o úmero centralizado na cavidade glenoide durante algum movimento de elevação anterior (2, 8).
Logo acima da articulação glenoumeral existem duas bolsas, localizadas de forma a evitar constantes atritos entre as partes ósseas e os tecidos moles adjacentes (5), denominadas subdeltoidea e subacromial. Especificamente, essas bolsas localizam-se numa zona de deslizamento entre um espaço virtual formado pelo arco acromioclavicular que, por sua vez, é formado pela relação do osso acrômio com o processo coracoide da clavícula. Essa relação se dá pelo ligamento coracoacromial de maneira que um teto protetor não permita impacto sobre as estruturas osteoligamentares (2, 6).
Outros músculos importantes na estabilização desta articulação são o bíceps braquial, na sua porção longa, e o deltoide. Anteriormente ao manguito rotador, passa o tendão do bíceps braquial que transpõe a cabeça do úmero inserindo-se proximalmente no tubérculo supraglenoideo da escápula (7) e distalmente na tuberosidade radial do osso rádio (5). Apesar de não fazer parte do manguito rotador, a porção longa do bíceps desempenha ação parecida, de forma a favorecer uma depressão e compressão da cabeça do úmero contra a cavidade glenoide, durante a contração muscular, especialmente no movimento de rotação externa do ombro (2). O deltoide origina-se no terço externo da clavícula, parte superior do acrômio e espinha da escápula e insere-se distalmente na tuberosidade deltoide do úmero (5), sendo essencial para os movimentos de flexão anterior e abdução do ombro. No entanto, uma ação de elevação da cabeça do úmero é realizada durante sua contração.
A articulação glenoumeral propicia a realização de vários movimentos que podem ser realizados isoladamente ou de forma combinada: flexão e extensão, adução e abdução, adução e abdução na horizontal e rotação interna e externa (9). A flexo-extensão é realizada no plano sagital ao redor de um eixo frontal, sendo a flexão máxima de até 180º e a extensão o movimento inverso; a abdução ocorre no plano frontal ao redor de um eixo sagital com liberdade de até 180º, sendo a adução possível neste plano apenas com 30º a 45º de amplitude quando associada a uma extensão.
Outro movimento da glenoumeral é a rotação, podendo ser realizada em qualquer plano com seu grau de amplitude dependendo diretamente do grau de elevação do braço (3). A partir de 90º de uma abdução podem ser realizados os movimentos de adução e abdução na horizontal, sendo estes realizados num plano horizontal ao redor de um eixo vertical (10).
A amplitude máxima de movimento na abdução do úmero depende da coordenação existente entre o úmero e a escápula, já apresentada como ritmo escapuloumeral (5). Portanto, a partir da posição anatômica, o movimento de abdução completa se realiza com a participação conjunta da articulação glenoumeral, articulação escapulotorácica e o tronco. Segundo Magee (6), "durante a abdução de 180º, existe, grosso modo, uma relação de 2:1 do movimento do úmero em relação ao da escápula."
Tanto em posição anatômica, rotação interna ou externa, a flexão anterior do braço propicia um deslocamento do tendão do supraespinhal sob a borda do acrômio anteriormente ou ligamento coracoacromial, desta forma, uma abdução ou flexão anterior do úmero ocasionará na projeção do supraespinhal, no nível de inserção, sob essas estruturas (2).
A elevação do úmero ocorre pela ação conjunta entre o músculo deltoide e manguito rotador (8), sendo o músculo deltoide (porção anterior) motor primário na flexão e os músculos deltoide (porção média) e supraespinhal motores primários na abdução. Além disso, tanto o manguito rotador quanto o deltoide realizam importantes funções biomecânicas durante a elevação do braço, que só é possível por causa das forças contrárias vetoriais exercidas por eles. Durante a flexão ou abdução do braço, o deltoide realiza uma força no sentido superior que eleva a cabeça do úmero, em contrapartida, os músculos do manguito rotador se contraem de forma a centralizar a cabeça umeral e deslizá-la inferiormente, impossibilitando assim um atrito ou impacto da cabeça contra o arco coracoacrômial ou sobre o próprio manguito (2).
Desta forma, qualquer alteração anátomo-patológica que interfira nesse mecanismo de sinergia muscular ou que comprometa a biomecânica normal do ombro, de forma que o músculo deltoide prevaleça sobre o manguito rotador, poderá ocasionar microlesões traumáticas de origem inflamatória e/ou degenerativas.
Referencias:
1. Santos OS, Bonamin C, Sobania LC, Otsuka N, Sobania RL. Síndrome do impacto: resultados do tratamento cirúrgico. Rev. Bras. Ortop. 1995;30(9):655-9. [ Links ]
2. Moreira C, Carvalho MAP. Noções práticas de reumatologia. Belo Horizonte: Health; 1998. [ Links ]
3. Kapandji AI. Fisiologia articular. 5a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2000. [ Links ]
4. Ghorayeb N, Barros T. O exercício: preparação fisiológica, avaliação médica, aspectos especiais e preventivos. Rio de Janeiro: Atheneu; 1999. [ Links ]
5. Hall SJ. Biomecânica da extremidade superior. In: Hall SJ. Biomecânica básica. 4a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2005. p. 179-219. [ Links ]
6. Magee DJ. Avaliação musculoesquelética. 4a ed. São Paulo: Manole; 2005. [ Links ]
7. Branw DE, Newmann RD. Segredos em ortopedia. Porto Alegre: Artmed; 2001. [ Links ]
8. Halbach JW, Tank RT. O ombro. In: Gold III JA. Fisioterapia na ortopedia e na medicina do esporte. São Paulo: Manole; 1993. p. 479-516. [ Links ]
9. Andrews JR, Harrelson GL, Wilk, KE. Reabilitação física das lesões desportivas. 2a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2000. [ Links ]