Contribuição da fisioterapia para Copa do Mundo
É senso comum afirmar que o futebol é uma caixinha de surpresas, exatamente pelo inesperado do resultado. São tantas as variáveis que podem influenciar no resultado de uma partida de futebol: a torcida vibrante e apaixonada, um técnico admirado e competente, titulares com garra e bem condicionados física e psicologicamente, reservas que mantenham o desempenho dos titulares, um bom preparador físico, um goleiro pouco vazado, para usar a terminação do meio, uma equipe médica inter e multidisciplinar, entre outras tantas coisas.
Mas, talvez nada disso se resolva a contento naquele momento, milésimos de um segundo, em que o jogador se machuca. A tristeza de deixar o campo, a incerteza da lesão, a vontade de voltar a jogar e ouvir novamente a torcida gritando seu nome: são situações cada vez mais frequentes no mundo atual, seja pela quantidade de jogadores de futebol, profissionais ou não, seja pela quantidade de competições disputadas simultaneamente, o que gera aumento da demanda física e do risco de lesões, seja pela mudança nas regras do esporte.
O fato é que o futebol é a modalidade esportiva mais praticada do mundo, contando com mais de 200 milhões de jogadores licenciados pela Federação Internacional de Futebol - FIFA e 400 milhões de adeptos em todo o planeta. É também responsável pelo maior número de lesões desportivas no mundo.
Por ser um esporte de contato, que exige do jogador alta velocidade de corrida, sprints, boa habilidade para passar a bola, saltar, chutar e desarmar, driblar, para realizar movimentos curtos, rápidos e não contínuos, arranques, que demandam força explosiva dos músculos de coxas e pernas, resistência de velocidade, com constantes mudanças de aceleração, desaceleração, direção do movimento e pivôs, é alto o índice de lesões em jogadores de futebol. Apesar dos dados serem muito abrangentes no que tange à frequência de lesões no futebol, é muito comum ocorrer, pelo menos, uma lesão em cada partida.
Estima-se que a incidência de lesões no futebol gire em torno de 10-24 a cada 1.000 horas de treino, podendo chegar a 53 lesões nesse mesmo período, sendo de quatro a seis vezes maior durante os jogos. Em um estudo que procurou identificar a frequência de lesões no futebol durante a 43ª edição da Copa América de 2011, em oito cidades da Argentina, competição organizada pela Conmebol, encontrou incidência de lesões esportivas em torno de 70 para cada 1.000 horas de jogo, com média de lesões por partida disputada de 2,42 durante a competição.
Ainda segundo a FIFA, em seu site oficial, em todos os esportes existem lesões típicas relacionadas ao gestual esportivo. Segundo o Centro de Pesquisa e Estudo Médico da FIFA, F-MARC, que desenvolve pesquisas com jogadores de futebol há mais de 15 anos, a grande maioria das lesões no futebol é de natureza leve a moderada e as mais frequentes são as contusões musculares e as entorses das articulações. Além dessas, os autores Chomiak e Woods acrescentam as distensões musculares. Em relação à parte do corpo do jogador mais acometida por essas lesões estão coxa e panturrilha, para as lesões musculares, e tornozelo e joelho, para as articulares. A grande maioria das lesões em membros superiores ocorre em goleiros, pelo desempenho de suas atividades.
Na 43ª edição da Copa América, de 25 contusões, nove foram em joelho, das 12 contraturas musculares, sete ocorreram na coxa, enquanto três na panturrilha. Os músculos da parte interna da coxa, chamado adutores, estiveram envolvidos com maior frequência nas contraturas de coxa. Lesões prévias e reabilitação inadequada foram apontadas como fatores de risco para lesões recidivantes .
As lesões articulares em tornozelo costumam ser as entorses e quando se trata do joelho, a lesão mais grave certamente é a do Ligamento Cruzado Anterior (LCA), que deixa o atleta afastado dos gramados por, pelo menos, quatro meses.
Do ponto de vista muscular, as distensões e contraturas mais comuns ocorrem na parte posterior da coxa, no músculo chamado de isquiostibiais e a distensão de adutores tem sido uma condição muito comum e que pode levar à pubalgia, condição que, para ser tratada, dura de três a nove meses, com interrupção da prática esportiva.
O estudo das lesões no futebol pode ser dividido em fatores intrínsecos ou individuais (como idade, lesões prévias, instabilidade articular, preparação física, habilidade) e fatores extrínsecos, relacionados à sobrecarga de exercícios, preparação física e treinamentos, o número de partidas, possibilidade de descanso entre as partidas, qualidade dos campos de futebol, equipamentos inadequados (chuteiras, roupas) e violações às regras dos jogos (faltas excessivas, jogadas violentas).
Pensando nos fatores intrínsecos, qualquer que seja ele ou mesmo uma associação entre eles, no final, o atleta apresentará, inevitavelmente, desequilíbrio muscular e articular, como causa ou consequência da lesão, o que significa que, promover o equilíbrio entre os diversos músculos do corpo e suas articulações é uma condição essencial para a saúde do atleta, prevenindo ou minimizando os efeitos das lesões.
Nesse momento, a fisioterapia é fundamental para cuidar desse atleta. Com técnicas como a terapia manual, alongamentos específicos, facilitação neuromuscular proprioceptiva, Reeducação Postural Global (RPG), crochetagem, tapping funcional, reequilíbrio neuromuscular, treinamento muscular proprioceptivo e pliométrico, entre outras, que, associadas às noções de biomecânica do esporte é possível reorganizar a função neuromuscular e articular do atleta, favorecendo o alinhamento biomecânico e o gestual esportivo, reduzindo, consequentemente, a probabilidade de lesões.