DPOC x Fisioterapia
A doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) é uma das doenças com maior mortalidade e menos conhecida em todo o mundo. Além de ser uma das principais causas de morte no mundo ela compromete em muito a qualidade de vida de seus portadores.
A doença pulmonar obstrutiva crônica é caracterizada pela limitação ao fluxo de gases na fase expiratória, podem ocorrer períodos de agudização acompanhada de insuficiência respiratória aguda. Os episódios de agudização estão associados com obstrução ao fluxo expiratório, hiperinsuflação dinâmica (leva ao encurtamento das fibras musculares do diafragma causando distorção geométrica do tórax e conseqüente desvantagem mecânica) e fadiga da musculatura da bomba torácica.
A DPOC é uma doença devastadora que progressivamente prejudica a capacidade de respirar da pessoa. A Organização Mundial de Saúde estima que a DPOC mata mais de 2,75 milhões de pessoas a cada ano. Uma pessoa morre a cada 10 segundos de DPOC. A OMS coloca a DPOC como a quarta maior causa de morte em todo o mundo ao lado da AIDS/HIV e atrás das doenças cardíacas, doenças cérebro vasculares e pneumonia. No Brasil cerca de 40000 pessoas morrem anualmente da DPOC, cerca de sete milhões de brasileiros sofrem desta doença. A DPOC é a doença respiratória de maior custo ao SUS.
Estima-se que cerca de 10 milhões de norte-americanos tenham DPOC sendo que, destes, 7,5 milhões seriam portadores de bronquite crônica e 2,5 milhões sofreriam de enfisema.
Existe variação internacional da taxa de mortalidade no DPOC, que é baixa no Japão (73/100000 habitantes) e alta na Romênia (433/100000), o que pode ser explicado por hábitos tabagistas e uso de cigarros diferentes.
O hábito de fumar é a principal causa da doença. No Brasil, 32% da população adulta é fumante. Estima-se que cerca de 15% dos fumantes de 1 maço/dia e 25% dos fumantes de 2 maço/dia terão DPOC futuramente se mantiverem o hábito tabágico.
Mas há indicações de que outros fatores ambientais possam contribuir para o seu surgimento. Entre eles, estão as infecções respiratórias repetidas, ocupações de risco, poluição do ar, exposição passiva ao fumo e dietas (maior consumo de peixes). Outro fator de risco, principalmente para o enfisema, é o fator genético. Isto se deve à comprovação de casos em que ocorre a deficiência de enzimas, relacionadas à destruição do parênquima pulmonar.7
DPOC
Esse conceito engloba duas entidades, a bronquite crônica e o enfisema pulmonar, sendo os pacientes acometidos geralmente pelos dois componentes simultaneamente, em grau variável.
O exame físico pode ser normal. Os pacientes com enfisema mais pronunciado tendem a ser magros, taquipnéicos, com tórax em barril, timpanismo, utilizando os músculos acessórios da respiração. Aqueles em que predomina a bronquite crônica, por outro lado, têm tendência à obesidade, são menos dispnéicos, cianóticos, com sinais de insuficiência cardíaca direta.8
O diagnóstico de DPOC é baseado na presença de sintomas, na história de exposição a fatores de risco e na presença de limitação ao fluxo aéreo que não é totalmente reversível, pacientes que tenham tosse crônica e produção de escarro, com história de exposição a fatores de risco, devem ter o fluxo aéreo testado, mesmo que não apresentem dispnéia. Para o diagnóstico e avaliação da DPOC, a espirometria é o padrão ouro, uma vez que ela é padronizada, reprodutível e objetiva. A gasometria arterial deve ser considerada em todos os pacientes com VEF1 menor que 30% do previsto ou com sinais clínicos sugestivos de insuficiência respiratória ou insuficiência cardíaca direita.3
A oximetria de pulso permite uma avaliação não invasiva do grau de comprometimento das trocas gasosas. Em pacientes com saturação inferior a 90%, está indicada a coleta de sangue arterial para determinação das pressões parciais de oxigênio (PaO2) e gás carbônico (PaCO2).
O diagnóstico inclui ainda análise de RX de tórax, eletrocardiograma devido à associação importante entre DPOC e doença cardíaca e testes da função pulmonar. A ausculta pulmonar tenderá a revelar diminuição do murmúrio vesicular quando a obstrução for muito acentuada ou na presença de enfisema, crepitações podem ser audíveis particularmente nos pacientes bronquíticos, durante as exacerbações é freqüente a sinbilância.
Enfisema Pulmonar
É um distúrbio do pulmão caracterizado por destruição das estruturas pulmonares, mais notadamente as paredes alveolares distais aos bronquíolos terminais. O tabagismo é o agente etiológico mais óbvio do enfisema.9
O enfisema é classificado em tipos específicos de acordo com a porção do ácino ou principal lobo afetado pela doença. São eles: enfisema centrolobular, enfisema panlobular, enfisema parasseptal, enfisema paracicatricial.
Os espaços aéreos formados têm uma área reduzida para a troca gasosa e a sua distensão pode ter um efeito negativo na perfusão pulmonar. Com a destruição do tecido elástico nas paredes alveolares e entre os bronquíolos respiratórios, a retração elástica é perdida resultando em retenção de ar e juntamente perde-se a tração radial que causa colapso precoce das vias aéreas na expiração, o que contribui para a retenção de ar.
Dentre os sinais e sintomas do enfisema temos: dispnéia, tosse, expiração prolongada, inatividade física, uso dos músculos respiratórios acessórios, hiperinsuflação. Os sons respiratórios são distantes devido ao tórax hiperinflado, mas os sons adventícios com sibilos e crepitações não são óbvios. O paciente freqüentemente assume uma postura sentado e fletido para gente sobre os braços para possibilitar maior vantagem mecânica para os músculos inspiratórios acessórios.9
Bronquite Crônica
É definida como um distúrbio em que a tosse do paciente produz escarro na maioria dos dias por no mínimo 3 meses consecutivos ao ano por pelo menos 2 anos.
A obstrução das vias aéreas e a diminuição associada dos índices de fluxo expiratório são os principais eventos fisiopatológicos provenientes da bronquite crônica. A obstrução das vias aéreas tem como causas principais a produção crescente de muco e o tamanho aumentado das glândulas, além disso possíveis alterações inflamatórias, hipertrofia da musculatura lisa brônquica e perda da estabilidade da cartilagem brônquica podem adicionar à obstrução.2
A obstrução é claramente demonstrada pela diminuição do VEF1 e pelo aumento da resistência das vias aéreas. A tosse é o sintoma característico e a tolerância ao exercício diminui lentamente.
A evolução da bronquite crônica caracteriza-se por infecções respiratórias, a expiração prolongada, sibilos e crepitações durante a expiração, cianose e edema periférico são as principais características físicas do paciente com bronquite crônica.
EXACERBAÇÕES DA DPOC
De acordo com Souza et al., contatou-se que a DPOC é um fator extremamente limitante nas AVD’s, pois ao aplicar o questionário do hospital Saint George na doença respiratória (SGRQ) comprovou-se que é um fator fidedigno de conclusão de limitação destas nos portadores.10
Segudno Brunetto Et al. , portadores de DPOC têm menor capacidade de exercício funcional , pois através de um teste de uma corrida de seis minutos , os pacientes de DPOC apresentaram diferença significativa entre a saturação de O2 em repouso durante o teste e a velocidade de caminhada a casa minuto em relação ao grupo controle.
A tromboembolia pulmonar é uma complicação que ocorre e é confirmada em considerável número de necropsias de pacientes com graves broncopneumopatias crônicas.
As exacerbações da DPOC estão associadas com piora da qualidade de vida dos pacientes, com aumento da morbidade e da mortalidade, além de poderem, como ocorre nas bronquiectasias e na fibrose cística, contribuir para a progressão da doença.
TRATAMENTO E REABILITAÇÃO
O programa de tratamento inclui uma série de medidas desde as de caráter profilático até as destinadas à correção das múltiplas alterações. Todos os fatores que causam ou agravam a DPOC devem ser afastados ou combatidos. Nesse sentido é essencial a supressão do fumo em face de sua ação já bem determinada.
Um cuidado adicional deve-se ter com drogas depressoras da respiração com os tranqüilizantes e narcóticos. É importante corrigir a obesidade pela sobrecarga ventilatória que acarreta, na qual a síndrome de Pickwick (hipoventilação pulmonar causada pela obesidade) pode estar associada.
O tratamento da DPOC tem como metas, diminuir a quantidade e viscosidade das secreções e previnir infecções respiratórias; remover ou previnir o acúmulo de secreções; promover relaxamento dos músculos acessórios da inspiração para diminuir a confiança na respiração torácica superior e diminuir a tensão associada com a dispnéia; melhorar o padrão respiratório dos pacientes; minimizar os ataques de dispnéia; melhorar a mobilidade tóraco inferior; melhor a postura e aumentar a tolerância ao exercício.
Diversos medicamentos podem ser usados com vantagens, quando administrados criteriosamente em seus pacientes. Os medicamentos mais utilizados são os broncodilatadores, antibióticos, corticoesteróides, muculíticos e fluidificantes.
O objetivo primário da oxigenoterapia é aumentar a quantidade de oxigênio carreado pelo sangue aos tecidos. Está indicada aos pacientes que, convenientemente medicados, mantiverem hipoxemia arterial crônica segundo os seguintes critérios: PaO2< = 55 mmHg ou saturação arterial de oxigênio < = 88%; PaO2 entre 56 e 59 mmHg com evidência de cor pulmonale ou policitemia; PaO2 < = 55mmHg ou satO2 <= 88% em exercício ou durante o sono ( suplementação será oferecida durante aumento da atividade física ou durante a noite). O objetivo do tratamento é o de manter a saturação de O2 ao redor de 90%.
Fisioterapia
A fisioterapia pulmonar constitui componente de grande valor do tratamento das DPOCs. O plano fisioterapêutico visa oferecer o melhor comportamento funcional do paciente, sendo útil o seu início o mais precocemente possível. Consta de exercícios respiratórios, exercícios de tosse, drenagem postural de todos os segmentos pulmonares, técnicas de percussão torácica associados à drenagem postural, pratica de exercícios destinados a coordenar a atividade física com a respiração, movimentação ativa e passiva dos membros superiores e inferiores, inclusive em pacientes hospitalizados, associação com a terapêutica inalatória.
O sucesso de um programa de reabilitação pulmonar depende da atenção a todos os componentes do processo patológico. Antes do início de um programa de exercícios, esforços são feitos para reduzir a resistência do fluxo e o trabalho da respiração através de broncodilatação e melhora da desobstrução das vias aéreas.
Demonstrou-se que técnicas manuais de percussão e tremor são úteis na mobilização de secreções das regiões pulmonares centrais, médias e periféricas na população com DPOC estável. Uma vez as secreções desprendidas e mobilizadas centralmente, os pacientes são instruídos nas técnicas apropriadas de limpeza das vias aéreas incluindo tosse e huffing. O huffing é útil pois promove estabilização das vias aéreas, melhorando portanto a limpeza eficaz das secreções.
Os exercícios respiratórios têm como objetivos na DPOC melhorar o desempenho do fole torácico aproveitando as reservas ventilatórias. Eles visam, portanto, melhorar o tônus e o desenvolvimento do diafragma e de grupos musculares das porções inferiores do tórax.
Esses exercícios incorporam técnicas que incluem: (1) o uso de posicionamento corporal para aumentar a vantagem mecânica do diafragma; (2) controle do padrão respiratório em repouso e durante exercício para diminuir a retenção de ar e o trabalho da respiração e (3) técnicas de relaxamento para diminuir o consumo de oxigênio e ajudar o paciente a ganhar autocontrole de seu padrão respiratório.
Estudos vêm demonstrando benefícios do treinamento da musculatura inspiratória em pacientes com DPOC, principalmente em relação ao aumento da capacidade de exercícios e redução da dispnéia. Um estudo recente (2004) avaliou os benefícios a curto e a longo prazo do treinamento da musculatura inspiratória na sua performance, na tolerância ao exercício e na percepção da dispnéia, e concluiu que pacientes portadores de DPOC submetidos a treinamento de força e resistência da musculatura inspiratória apresentaram melhora na performance dos exercícios, no teste de caminhada de 6mim e na sensação da dispnéia, sem melhoras significativas na espirometria. Os benefícios do treinamento declinam se houver suspensão dos exercícios.13
O programa de treinamento físico pode ser dividido em quatro etapas:
1ª etapa: exercícios de aquecimento para membros superiores e inferiores, sem carga e com duração de 15 minutos ininterruptos, de acordo com a capacidade de cada paciente, consistindo de atividades calistênicas associadas ao ciclo respiratório;
2ª etapa: exercícios não sustentados de membros superiores, utilizando dois movimentos em diagonal com peso (halteres) durante dois minutos, com intervalo de tempo idêntico para repouso. O aumento semanal da carga estava condicionado à capacidade individual de cada paciente. O peso inicial a ser utilizado foi determinado previa e individualmente pelo teste incremental, com intuito de trabalhar inicialmente com 50% de carga máxima sustentada pelo paciente.
3ª etapa: treinamento de membros inferiores desenvolvido na bicicleta ergométrica com tempo predeterminado e evolução semanal. A potência a ser desenvolvida foi determinada individual e previamente ao início do programa, objetivando um trabalho de 50% da capacidade física máxima do indivíduo;
4ª etapa: posturas de alongamento da musculatura utilizada durante a sessão.14
A maior propensão dos músculos ventilatórios à fadiga muscular torna cabível a introdução de períodos de repouso, alternados com a fisioterapia e, eventualmente, o treinamento muscular específico.
Um teste bastante utilizado nos programas de reabilitação pulmonar é o teste de caminhada dos 6 minutos (6MWD). Um estudo recente (2004) verificou as modificações do 6MWD ao longo do tempo e sua correlação com o VEF1 e com a mortalidade desses pacientes, concluindo que o 6MWD foi um índice melhor que o VEF1 em predizer a mortalidade dos pacientes portadores de DPOC nesse grupo de estudo. A melhor explicação para tal fato é que a distancia percorrida durante o 6MWD não depende apenas do aparelho respiratório, mas também da condição cardiopulmonar, nutricional e da musculatura periférica.
Junto ao programa de reabilitação física é realizado um programa de reabilitação psicológica. Essa reabilitação psicológica do paciente com DPOC é importante para que ele faça o tratamento medicamentoso corretamente. Por ser uma doença muito comum em homens de meia-idade, de certa forma, limitante, é comum haver depressão associada. Por isto, alguns pacientes acabam achando que o tratamento é pura perda de tempo. Não tomam seus remédios e continuam fumando. É claro que isto acaba piorando as condições clínicas, e o paciente se deprime ainda mais e isso se torna um ciclo vicioso.Ansiedade e a depressão são comuns em pacientes portadores de DPOC.
Intervenção da Fisioterapia durante a Ventilação Mecânica Não Invasiva - O papel do fisioterapeuta inclui desde a avaliação do paciente até a seleção do equipamento e montagem , adaptação do paciente à máscara e à maquina, educação do paciente e da família a respeito da terapia , além de monitoração contínua das respostas do paciente à terapia. Suas habilidades e conhecimentos a respeito de doença respiratória , além da experiência em avaliar a função ventilatória e suas manobras para promover o descanso dos músculos respiratórios fadigados , coloca-os em uma boa condição para administração da VNI. Quando se implementa o suporte ventilatório não–invasivo , o treinamento do paciente para adaptar a máscara e o fluxo do equipamento é essencial para sua aceitação . Os pacientes portadores de DPOC com hipercapnia e acidose respiratória podem se beneficiar de suporte ventilatório não invasivo, como CPAP e BIPAP. Em caso de insucesso, intubação e ventilação mecânica invasiva podem ser necessários. Devem ser observadas medidas para diminuir a hiperinsuflação e o auto PEEP, tais como: utilização de freqüência respiratória baixa, baixo volume corrente (7 a 8 ml/kg), relação I/E aumentada, fluxo inspiratório alto, otimizando desse modo a expiração. A utilização de PEEP durante a ventilação mecânica deve ser criteriosa e nunca o valor da PEEP pode ser maior que o auto – PEEP. Há também a necessidade de monitorização e ajuste do respirador2 para otimizar o suporte ventilatório e maximizar o seu conforto, o que exige um sólido conhecimento da fisiologia respiratória, assim como habilidade clínica em avaliar a resposta à terapia3 . A monitorização do paciente é essencial para o sucesso da técnica . Deve ser feita através de oximetria contínua e dióxido de carbono transcutâneo para avaliar as trocas gasosas. Em pacientes com hipercapnia severa , é aconselhável a gasometria .Os parâmetros ventilatórios devem ser ajustados baseados nos resultados da gasometria arterial obtidos a cada hora, dependendo das condições clínicas do paciente. Além disso , as respostas subjetivas (dispnéia , conforto e estado mental) e objetivas (Fb, FC, FiO2 e o uso dos músculos acessórios) e possíveis complicações (distensão abdominal , necrose facial, retenção de secreções, dificuldade respiratória , náuseas ou vômitos) devem ser monitorizadas.
O uso da VNI deve ser considerado como um coadjuvante para outras técnicas fisioterapêuticas, como parte de um programa global de reabilitação.
A atuação da fisioterapia melhora a sobrevida do paciente , aumentando a capacidade de ventilação/perfusão , reeducando postura e músculos inspiratórios e expiratórios e dando maior independência ao paciente , sendo que os resultados são ainda melhores se feitos com uma equipe multidisciplinar, para retirar a ansiedade , depressão e outras complicações do paciente portador de DPOC.